segunda-feira, 22 de março de 2010

Fantasmas



Sexta feira à noite e estou sozinha com os fantasmas. Na minha casa está tudo escuro, a não ser as frestas de luz artificial que atravessam as venezianas da sala.
É sexta-feira, início de final de semana, dia de comemoração, desculpa para esquecer problemas, porém na minha casa está tudo com a mesma melancolia dos outros dias. Os móveis antigos da sala, o aparador de metal que guarda fotos antigas de uma família perfeita, estão com o mesmo ar de velhos e cansados de servirem e não terem descanso.
Na cozinha, a velha fruteira, o armário em baixo da pia, o interruptor e a galinha de gesso colorindo a geladeira estão esquecidos hoje como nos outros dias. Pobre fruteira, parada ali, dia e noite, sem nenhuma frutinha para fazer valer sua disposição naquele lugar.
No banheiro, produtos para cabelo, cosméticos para infinitas correções e um espelho, o único que me vê nua, vestindo somente minha pele, e que acusa da maneira mais crua todos os meus pensamentos. O espelho do banheiro tem vida própria.
No meu quarto, quadros na parede, mais fotos na estante, livros, CDs, mesa, cadeira e uma janela que dá para uma imensidão de pontinhos brilhantes, uma cidade que pulsa em cada esquina. Aqui também há espelhos, mas estes nunca dizem nada. O meu quarto está repleto de mundos para se viajar, cheio de imagens para se imaginar e cheio de papéis a me lembrar: “sen (a+b) = sen a . cos b + sen b . cos a”, “Porque ou porquê?” , “Dr. Alexandre na segunda”. Meu quarto é um escudo de vaidades e mentiras leves.
Por um momento quis aproveitar esse tempo livre para fazer uma faxina geral na minha casa, mas desisti no momento seguinte. Demanda muito dos músculos arrastar a mobília, sem falar que debaixo dela há sempre uma barata que nos espanta pela feiúra e inconveniência de suas patas.

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